O Presidente da República sancionou o tão esperado projeto de lei denominado “FICHA LIMPA”, que resultou na Lei Complementar n.º 135 de 4 de junho de 2010 publicada no DOU de 7.6.2010.
Antes mesmo da sua publicação já gerou várias discussões sobre sua aplicabilidade. Se se aplica ou não já para as eleições gerais que ocorrerão em outubro próximo.
A Constituição Federal dispõe em seu art. 16 que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. Resta saber se a lei altera ou não o processo eleitoral.
Ao nosso sentir a Lei da Ficha Limpa, que alterou a lei das inelegibilidades [LC 64/90] não altera o “processo eleitoral”. Está voltada não para o sistema eleitoral, mas para os critérios ético-constitucionais necessários ao registro das candidaturas.
O Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de enfrentar o assunto quando do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 129.392, julgado em 17-6-1992, e entendeu que a lei de inelegibilidades, por complementar o regime constitucional de inelegibilidades, tem aplicação imediata. Assim, sob o viés da anualidade não existe incompatibilidade.
Entretanto, sob o prisma da anterioridade a lei merece maior análise e reflexão, pois se aplicada imediatamente irá subtrair da disputa eleitoral vários candidatos que não têm ‘ficha limpa’.
Cabe ressaltar que o Supremo Tribunal Federal também já manifestou sua posição ao julgar o Mandado de Segurança nº 22087-2, da Relatoria do Min. Carlos Velloso, e entendeu que “Inelegibilidade não constitui pena. Possibilidade, portanto, de aplicação da lei de inelegibilidade, Lei Complementar nº 64/90, a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência”.
Com todo respeito a esta decisão do Supremo, entendemos que ela viola o princípio da anterioridade, sustentáculo da segurança jurídica. Caso esta lei seja aplicada imediatamente, já para as eleições próximas, ainda que para fatos ocorridos antes da publicação da lei, vários ‘atores’ estarão fora da disputa, o que lhes causará surpresa, já que a regra do jogo foi alterada aos 45 do segundo tempo.
Sob o ponto de vista moral e do anseio social é indiscutível que há um consenso que a lei seja aplicada imediatamente, desconsiderando os argumentos jurídicos.
Desta forma, em atenção ao princípio da segurança jurídica, é salutar que a lei seja aplicada somente a fatos posteriores à sua publicação, pois se as leis são normas de conduta, não podem exigir condutas diversas no passado, sob pena de aniquilar várias pessoas por comportamento que não lhes eram exigíveis.
Não obstante, o Tribunal Superior Eleitoral, vai decidir uma consulta sobre a aplicação das inelegibilidades nas eleições 2010 sobre a possibilidade de aplicação da Lei Ficha Limpa nas eleições deste ano.
A consulta foi protocolizada perante o TSE pelo senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), com dúvida sobre a aplicabilidade de lei eleitoral já para as eleições de 2010, caso esta norma entre em vigor até o dia 5 de julho, prazo final para o registro de candidaturas perante a Justiça Eleitoral. Em sua consulta, ajuizada antes da sanção da lei, o senador se referiu à aprovação do projeto de lei que limita a entrada na disputa eleitoral de candidatos que não atendam a requisitos mínimos de vida pregressa.
Assim, aguardemos o TSE manifestar seu posicionamento, se jurídico ou político-social.
Márcio Gonçalves
Advogado.
Professor Universitário
Pós Graduado em Direito Eleitoral
Pós Graduado em Direito Processual Civil